[…– Admiro bastante os escritores – disse-me – a imaginação que têm e a facilidade com que a transformam em frases marcantes. Tu tens essa qualidade. A de criar frases que não se esquecem. Há uma, por exemplo, que eu sempre recordarei por a ter achado linda: “Eu tive uma fazenda em Àfrica”...
– Eu conheço – interrompi – da Karen Blixen em África Minha.
– Sim. Ou da Meryl Streep no filme. Chega uma altura em que não consigo dissociar a frase do rosto que a disse. Mais do que de quem a escreveu. Mas, seja de quem for, é uma frase que me causa uma certa nostalgia. Começar uma história a dizer aquilo que se teve é, no mínimo, sublime. Dá a sensação de que tudo o que aconteça daí para a frente não fará sentido, não terá importância, por mais dramático que venha a ser, por estarmos protegidos por um escudo que nos dá imunidade, o escudo daquilo que já tivemos. “ Eu tive uma fazenda em África” – declamou – É como quando se é garota e nos acontece alguma coisa ruim. Dizemos para os outros: “ não faz mal. O meu pai é bombeiro”…]
In "O Canto do Cisne" de João J. A. Madeira
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