[…Levantei a cabeça do meu
caderno e do meu café, meio frio e meio vazio, a tempo de ouvir a pergunta que
o Cisne me fazia. Parada, com as mãos apoiadas nas costas da cadeira à minha
frente, perguntava-me, não pela primeira vez:
–– Tu és escritor?
Devo ter feito uma expressão
de pasmo devido ao ineditismo da situação, pois nunca ninguém me dirigia a
palavra. Talvez por isso, sorriu e repetiu:
–– Mais uma vez te pergunto
se és escritor.
Foi a minha vez de sorrir e,
mastigando lentamente a pergunta que me fazia, acabei por responder:
–– Sou. Porque escrevo.
Deu uma ligeira gargalhada
e, sem qualquer convite ou anuência da minha parte, acabou por desviar a
cadeira e sentar-se.
–– Não faz mal. Também há
quem diga que sou um ser humano porque falo. E que escreves tu quando estás
para aí com a caneta zuca, zuca, zuca? – e fazia o gesto de escrever, com a mão
direita.
De certo modo grato pela
quebra de rotina, recostei-me na minha cadeira e falei, com agrado, para
aqueles olhos:
–– Oh! Coisas simples,
triviais, conforme vou imaginando. Episódios da minha vida, do que me rodeia,
às vezes até do que sonho acordado. Embora aí o resultado ande mais pela ficção
científica…]
In "O Canto
do Cisne" de João J. A. Madeira
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